Comunicação organizacional: a imprensa tradicional não pode mais ser o único foco da assessoria
Há alguns meses, concedi entrevista para uma estudante de MBA que estava fazendo seu TCC sobre Comunicação Organizacional. Uma pergunta dela me fez pensar sobre como a comunicação nas instituições mudou com a chegada do digital. É coisa pra caramba pra falar sobre isso e eu decidi dividir o tema em artigos. Hoje: assessoria de imprensa.
Quero trazer, primeiro, um testemunho que sempre causa risadas entre os comunicadores mais novos. Quando eu comecei a trabalhar com comunicação organizacional, em 1999, já existia um “gostinho” de digital, porém os recursos eram muito limitados. A capacidade de armazenamento de arquivos no e-mail não comportava uma foto e, por isso, quando preparávamos material para enviar para a imprensa, o texto ia por e-mail, mas as fotos eram salvas em disquetes e entregues nos jornais pelo motorista.
Mas, não foi apenas a evolução do hardware que mudou a forma como fazemos comunicação organizacional.
Comunicação digital envolve as outras comunicações
Margarida Kunsch, precursora do estudo da Comunicação Organizacional, criou uma classificação que, durante muito tempo, foi utilizada por acadêmicos e profissionais da área para desenhar estratégias integradas de comunicação dentro de uma instituição. De acordo com Kunsch, uma organização possui 3 áreas da comunicação: Relações Públicas, Marketing e Interna.
De fato, o modelo de Kunsch traz muita clareza sobre todas as áreas que devem ser percebidas pelos comunicadores organizacionais, porém ele não contempla o digital tão presente e, arrisco a dizer, base hoje de todas as estratégias. Essa minha afirmação não é revolucionária. É possível ver inúmeras pesquisas acadêmicas sobre isso. Aqui, eu trarei algumas percepções que tenho a partir da minha vivência nesses 23 anos como comunicadora organizacional.
A minha afirmação de que o digital é a base de todas as estratégias de comunicação se ancora na impossibilidade de executar qualquer uma das áreas da imagem acima sem utilizar o ambiente digital. É comum associar o digital apenas às estratégias de marketing e redes sociais (é só ver como a maioria das agências se dividem, inclusive o Conversa. É assim que o mercado tem dançado). No entanto, todas, sem exceção, estão envolvidas pelo digital.
Assessoria de imprensa: a chegada dos novos veículos
Vamos falar sobre assessoria de imprensa, que é a área que mais domino. Quando eu lecionava sobre o tema, sempre trazia a provocação de que não existe mais assessoria de imprensa sem o digital. A definição de veículo de imprensa foi ampliada à medida que a dinâmica de produção de conteúdo rompeu as barreiras entre produtores e consumidores, e fez com que todos se tornassem criadores de conteúdo em potencial. Não vou entrar no mérito da qualidade de produção de informação (isso daria outro artigo rs).
Dessa forma, não há como ignorar os novos veículos que surgiram: os blogs (pioneiros), os canais em streaming de vídeos e os podcasts em streaming de áudio.
Um estudo realizado pela plataforma CupomValido.com.br com dados da Statista e IBOPE, divulgou que o Brasil é o terceiro país que mais consome podcasts no mundo, ficando atrás apenas da Suécia e da Irlanda. Dessa maneira, é inegável que esses espaços possuem audiências relevantes para os clientes de assessoria de imprensa.
No caso dos vídeos, vamos falar da principal plataforma do mundo: o YouTube. Em agosto, a empresa lançou o seu Relatório de Impacto Econômico, desenvolvido em parceria com a Oxford Economics, em que afirmava que o ecossistema criativo do YouTube contribuiu com mais R$ 6 bilhões para o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro em 2021, um aumento de 50% em relação ao ano anterior. Alia-se a isso a queda de audiência das TVs convencionais, e é seguro dizer (eu não sou a primeira) que canais famosos de entrevistas no YT oferecem um alcance muito maior que reportagens em alguns canais. Tem como desconsiderar isso na hora de criar uma estratégia de assessoria?
A imprensa cresceu para além do portal
Quem estudou “jornalismo on-line” no início dos anos 2000, leu muito sobre a adaptação da imprensa para o formato de portal e como isso se deu de forma gradativa. A assessoria de imprensa assimilou essas mudanças e hoje apresenta estratégias bem direcionadas para esse tipo de mídia. No entanto, nem toda assessoria de imprensa tem levado em consideração outra importante mídia desses veículos: as suas redes sociais. Ainda não é comum ver o assessor de imprensa negociar que a inserção seja divulgada também nos perfis dos veículos.
Não avalio que isso seja falta de habilidade do assessor, mas essa virada ainda não aconteceu também pela dificuldade de mensurar o retorno financeiro que esses posts trazem (a famosa centimetragem). Do lado de lá da redação, também não há ainda um entendimento editorial claro nas redes (na maioria dos veículos, principalmente os ‘regionais’).
Estamos caminhando, mas a incorporação dos canais digitais pela assessoria de imprensa não acontecerá sem um entendimento mútuo com os veículos de comunicação. Façamos como sempre fizemos em terrenos desconhecidos: revendo práticas e aprendendo novas técnicas.
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Kadydja Albuquerque é jornalista e sócia do Conversa Estratégias de Comunicação Integrada